(*) Vitor Bento Munhao
No passado dia 1 de Abril de 2016, com a nova legislação
de comparticipação nos dispositivos médicos para ostomia, de facto deu-se um
passo muito importante no apoio económico aos portadores desta condição física
onde e consubstanciado na Portaria 286/2016 e subsequente é atribuída a
comparticipação a 100% sob os dispositivos médicos para ostomia de eliminação no
entanto alguns, ficaram de fora, nomeadamente o dispositivo pediátrico ao qual
ainda hoje não se entende qual a razão de não ser considerado, apesar de tudo foi
importante e uma batalha ganha em prol da pessoa ostomizada.
A publicação da referida portaria, do nosso
ponto de vista em nada iria implicar a obrigatoriedade da pessoa com ostomia a recorrer
em exclusivo às farmácias julgamos que e segundo melhor leitura apenas
estabelece a uniformização de alguns procedimentos como é o caso da receita
electrónica, passada pelo médico e não pela enfermagem ou os respectivos
indicadores a constar na receita electrónica estabelecendo as normas junto dos
estabelecimentos farmacêuticos, situação que não existia até ao momento, pois a
esmagadora maioria das farmácias não tinha conhecimento técnico do dispositivo
nem o tinham em stock.
No entanto tudo foi alterado do ponto
de vista do direito da livre escolha e da privacidade do sujeito através da
publicação da Portaria 111/2018 e aqui, sim estranhamos o facto do Ministério
da Saúde obrigar a pessoa com ostomia a obter o seu dispositivo em exclusivo
junto da farmácia da sua residência, doentes com incontinência ou retenção urinária com residência em
localidades afastadas nas quais não disponham por perto de uma farmácia; que
não tenham forma de se deslocar e/ou que não tenham apoio domiciliário não podem
adquirir tais dispositivos e/ou outros produtos relacionados. Terão que esperar por alguém que os possa acompanhar junta da farmácia
e/ou suportar, por sua conta, as despesas de deslocação à farmácia para fazer a
aquisição.
Tal medida é incomportável para a pessoa com ostomia, que residam no
interior do pais, com dificuldades acrescidas de deslocarem-se, por vezes, aos
grandes centros urbanos. Em alguns dos casos os doentes ostomizados necessitam
de tais dispositivos ou tecnologias de saúde com a máxima urgência (veja-se a título de exemplo os “sacos”
para que possam defecar ou urinar).
A actual Portaria n.º 111/2018, de 26
de abril nem tão pouco prevê o simples facto de, atento a especificidade dos
medicamentos e tecnologias de saúde dos doentes ostomizados, os mesmos tenham
que ser encomendados pela farmácia da área de residência, inibindo em muitos
casos que a pessoa se possa deslocar quando por um direito que lhe assiste
optava por adquirir o dispositivo médico longe da sua zona de residência de
forma a manter o anonimato.
A título de exemplo, um ostomizado que necessite de ter
um “saco” para poder urinar ou defecar corre graves riscos de ter que deslocar-se de
casa à farmácia e não ser possível adquirir o dispositivo médico “sacos” no
imediato ou nos dias subsequentes atendendo a que a esmagadora maioria das
farmácias não cria stock para entrega o que consideramos por em risco, inclusive,
a sua integridade física e/ou a própria vida em virtude de infecções graves.
Tudo, alegadamente, em nome da necessidade de garantir a qualidade e
segurança dos medicamentos e das tecnologias de saúde. Os mesmos que, por
exemplo, são entregues pelos fornecedores às farmácias por empresas de
transporte sem essa condição, ou seja, a necessidade de garantir qualidade e
segurança do medicamento neste caso do dispositivo só revela especial cuidado,
para o Ministério da Saúde, para o Ex.mo Sr. Secretário de Estado Adjunto e da
Saúde, quando sai da farmácia para o doente e não quando sai do fornecedor até
à farmácia.
A Portaria n.º 111/2018, de 26 de abril não garante a defesa e a
protecção da identidade dos doentes ostomizados, obrigando-os a irem às
farmácias, em condições físicas débeis ou debilitadas, em contacto com os
demais utentes da farmácia e a serem expostos a uma situação incómoda, vexativa
e humilhante.
Decretar a limitação da entrega dos dispositivos médicos (sacos) a
doentes ostomizados, o Governo, através do Ministério da Saúde, impediu o
acesso à livre escolha de farmácia revelando, igualmente, o profundo
desconhecimento pela realidade das farmácias em Portugal pois é a própria
Associação Nacional de Farmácias distribui, regularmente, por intermédio das
farmácias portuguesas, folhetos informativos em que admite que nem todas as
farmácias têm meios de transporte, e que o possam fazer único e exclusivamente
por técnico de farmácia.
Para além do supra exposto a transferência, para os doentes ostomizados,
dos custos de deslocação para a aquisição do dispositivo médico representa para
os próprios uma diminuição significativa do poder de.
No caso dos medicamentos e tecnologias de saúde dos doentes ostomizados,
os dispositivos são classificados como dispositivo médico de classe 1 classificação
essa de cariz internacional e comum para todos os países europeus e dos quais o
risco é muito baixo ou inexistente não subsistindo, até à presente data,
qualquer registo de problemas de saúde pública nem de recolha de mercado
associado em Portugal ou países da Europa, existindo tais produtos no mercado
português há mais de 30 anos.
Acrescenta-se ainda o facto desta Portaria n.º 111/2018,
de 26 de abril não configurar, sequer, a realidade do tratamento dos doentes
ostomizados em Portugal onde e efectivamente na maior parte das vezes os
doentes são acompanhados nos respectivos hospitais ou clinicas médicas longe da
sua área de residência e posteriormente acompanhados por enfermeiros
especialistas e voluntários das associações de cariz social e/ou de utilidade
pública também denominadas Ligas dos Amigos dos Hospitais ou outras associações
sendo que as farmácias de apoio são muitos vezes as que estão nas imediações de
tais unidades hospitalares.
Em suma, até as próprias farmácias nos contactam no
sentido de informar que não possuem condições logísticas nem para a
distribuição por via de um técnico ou um ostomizado que nos telefona a informar
que se recusa ir a uma farmácia da sua zona de residência a Centro de Portugal
e que mandava vir o dispositivo médico a sul de Portugal e agora não o pode fazer
ou aquele Empregado de mesa ou outro que por acaso até é vendedor da Macdonalds
mas, que com a publicação da Portaria11182018 é obrigado a “desmascarar-se”
perante a sociedade.
(*) Assistente Social - Licenciado em Serviço Social - Pós-graduação em Serviço Social / Gestão de Unidades Sociais e de Bem-estar - Doutorando em Serviço Social pelo ISCTE - Member of the British Association of social Worker - BASW - Member of the Portuguese Association of Social Service - APSS - Member of the World Council of Enterostomal Therapists - WCTE
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